Queria ser padre , mas se tornou escritor, poeta panfletário , anticlerical , humanista , pacifista, republicano*
"O que é a vida?
A vida é o mal. A expressão última da vida terrestre é a vida humana, e a vida dos homens cifra-se numa batalha inexorável de apetites, num tumulto desordenado de egoísmos, que se entrechocam, rasgam, dilaceram.O Progresso, marca-o a distância que vai do salto do tigre, que é de dez metros, ao curso da bala, que é de vinte quilómetros. A fera, a dez passos, perturba-nos. O homem, a quatro léguas, enche-nos de terror. O homem é a fera dilatada.
Nunca os abismos das ondas pariram monstro equivalente ao navio de guerra, com as escamas de aço, os intestinos de bronze, o olhar de relâmpagos, e as bocas hiantes, pavorosas, rugindo metralha, mastigando labaredas, vomitando morte. A pata pré-histórica do atlantossauro esmagava o rochedo. As dinamites do químico estoiram montanhas, como nozes. Se a preza do mastodonte escavacava um cedro, o canhão Krup rebenta baluartes e trincheiras. Uma víbora envenena um homem, mas um homem, sozinho, arrasa uma capital."
"Quem se quiser salvar, há de salvar os outros. Quem renegar a natureza, renega Deus. A ascese egoísta, eis o ateísmo verdadeiro. A imobilidade é sacrílega, a escuridão é sacrílega, o silêncio é sacrílego. A vida é som, é luz, é movimento. A vida marcha por abismos, trágica e formidável, mas ruidosa e sinfónica, vestida de luz e de mil cores. Amortalhá-la de negro, arrancar-lhe a língua, para que não cante, e os olhos, para que não deslumbre e não dardeje, é como se lhe cravássemos no coração uma facada sinistra. O quietismo beato, apagando o universo, apaga Deus. Quietismo e niilismo,--dois zeros, dois sinónimos. O frade católico, na concha da mão, exangue e paralítica, sustenta uma caveira. É o nada olhando o não ser. O monge ideal, na dextra poderosa, em vez da caveira, tem um globo de oiro constelado. Tem o universo. É o monge futuro."
1902.3 / Guerra Junqueiro ( 1850-1923).
Carta-Prefácio de GUERRA JUNQUEIRO para o livro "Os Pobres" de RAUL BRANDÃO
http://www.gutenberg.org/files/20841/20841-h/20841-h.htm
Poemas de Guerra Junqueiro
http://www.becodogatopreto.hpg.ig.com.br/poesias/guerra01.html
O que me agrada em Guerra Junqueiro é seu entusiasmo, bem explicado aqui : http://www.bragancanet.pt/filustres/guerra.html
*A monarquia portuguesa se extinguiu apenas em 1910. Ser republicano antes disso, em Portugal , era ser um revolucionário. O anticlericalismo , em Guerra Junqueiro, não representava falta de espiritualidade cristã, mas sim a crítica ao poder político conservador exercido pela Igreja Católica naquele momento monarquista.
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Imposssível não lembrar das aulas de literatura da Madre Simões !!
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sábado, junho 27, 2009
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